A coca-cola do esquecimento ou o caldo de cana da saudade Imprimir
Escrito por Yoani   
Domingo, 20 de Diciembre de 2009 18:33

Por Yoani Sánchez

Tenho vivido aqui e lá. Tenho sido uma voz pedindo a permissão para sair do meu país e uma exilada esperando pela autorização de entrada. O mecanismo tem me triturado com ambos os lados de suas rodas dentadas: por estar fora e por me decidir a ficar na minha Ilha. Fui à um consulado para pagar as altas tarifas mensais de permanência em outro país e tive que enfrentar também o custo do regresso, a enorme quantia pessoal de ser uma “retornada”. Durante dois anos olhei a Ilha a distância e tive o dilema de tomar a “coca-cola do esquecimento” ou o “caldo de cana da saudade”, porém nenhum dos dois desceu pela minha garganta. Preferi o agridoce sabor desta realidade.

Tenho pesadelos de que entro pela alfândega cubana e um uniformizado me conduz à um quarto cinzento. Rodeada de paredes desbotadas e de uma enorme foto de Fidel Castro, tiram meu passaporte e me anunciam que se entrar não poderei - nunca mais - viajar à outro destino. Tudo isto é explicado por um funcionário de cara suarenta, que tem uma pistola nas costas e uma esferográfica sobressaindo do bolso. Pressinto que passarei para a eternidade frente este de ser de palavras rudes, sem a possibilidade de cruzar a porta até o salão onde minha família espera. A inquietude chega a um ponto em que desperto e comprovo que continuo na minha casa, igualmente prisioneira, porém satisfeita de haver voltado.

Tão obsessivo sonho se alterna com outro no qual não me deixam voar até o meu próprio país. Estou num aeroporto longínquo, tratando de pegar uma nave com destino à Havana. A jovem que examina as passagens me diz que não posso embarcar. “Temos ordens de não deixá-la subir”, conclui, sem a carga dramática de quem acaba de notificar outro da sua condição de expatriado. Não há ninguém à quem apelar e as lousas eletrônicas marcam as próximas saídas para Nova Iorque, Buenos Aires, e Berlim. Sento-me e coloco a bagagem sobre minhas pernas, para me apoiar nela e tentar dormir. Isto não pode ser verdade - digo `a mim mesma - tenho que descansar e quando despertar estarei na cabina, a milhares de metros de altura.

Já experimentei com chá de tilo, com ler histórias de pilotos antes de deitar e colocar música relaxante na casa. Porém a única coisa que terminará com esta sequencia onírica de clausura e expulsão é o fim das restrições migratórias para os cubanos. Quero ter o direito de viajar, como também quero poder dormir sem ver o uniformizado que me toma o passaporte e sem escutar o ruído de uma vião que levanta vôo, deixando-me em terra alheia.

Traduzido por Humberto Sisley de Souza Neto

Última actualización el Jueves, 24 de Diciembre de 2009 18:49